Senta aqui um pouquinho, meu filho… deixa eu te contar uma coisa que carrego comigo desde moleque… É sobre o melhor amigo que já tive nessa vida: o Bento, meu cachorro.
Eu ganhei o Bento ainda piá... era só um fiapinho de cachorro, da barriga da cadela de um vizinho. Magrelinho, orelha torta, mas os olhos... ah, os olhos pareciam que me entendiam desde o começo.
Nós dois crescemos juntos, correndo na roça, brincando no pasto, nadando no rio. Onde eu tava, ele tava. E vou te falar, Bento era daqueles que não deixava ninguém encostar em mim. Tinha uns meninos, vizinhos mais velhos, que viviam me bulinando, querendo me bater. Mas bastava um "psiu" e lá vinha o Bento, correndo que nem um raio. Não mordia ninguém não, mas latia, botava os moleques pra correr, e depois voltava abanando o rabo. Eu ria demais… era meu herói.
Mas um dia... ah, um dia meu pai resolveu prender o Bento. Disse que eu já era grandinho pra ir pra escola sozinho, sem cachorro atrás. Prendeu ele no fundo do sítio com uma corrente pesada… lembro da cara dele olhando pra mim, como quem dizia: “Não vai sem mim não…”
Só que eu fui. Peguei minha mochila e fui andando pela estradinha de chão batido, o barro molhado da chuva da noite anterior ainda colando nos meus pés. Tinha que passar pelo mato, por um córrego… caminho de sempre.
Foi aí que, do nada, um dos meninos apareceu. Não disse nada, só pegou uma pedra grande e jogou em mim. Acertou bem na minha cabeça… caiu sangue no olho e tudo ficou embaralhado. Eu lembro de gritar… gritei alto:
— BENTO! BEEENTO!
E, meu filho… de lá do outro lado do sítio, o Bento ouviu.
Ele pulou o cercado, rasgou o arame e veio feito trovão. Quando ele chegou, eu já tava no chão, tonto, e os meninos estavam rindo… mas quando escutaram o latido dele vindo do mato, correram como o diabo foge da cruz.
Só que aí… um pai de um dos meninos apareceu armado.
Disseram pra ele que o Bento tinha atacado. Mentiram.
O homem nem pensou… mirou e atirou.
O tiro pegou no Bento.
Ele caiu perto do rio e a correnteza levou ele embora…
Eu acordei no meu quarto, dias depois. Com a cabeça enfaixada e meu pai do lado.
A primeira coisa que perguntei foi:
— E o Bento, pai? Cadê o Bento?
Meu pai olhou pra baixo… demorou pra responder. E falou com a voz embargada:
— O Bento... foi embora, filho. Ele... ele subiu.
Mas eu sabia. Eu sentia que ele ainda tava por aí.
Saí pela roça, gritando, procurando, todos os dias. Mas nada.
Passaram dias… semanas… quase um mês.
Até que um dia, de madrugada, eu ouvi… bem fraquinho, lá no meio da mata…
Um uivo.
Lento. Triste.
Fui correndo, com o coração batendo no peito, e segui aquele som.
Quando cheguei no barranco, lá tava ele.
Magro. Sujo. Com um buraco na barriga quase fechado.
Mas era o meu Bento.
Ele abanou o rabo com tanta força que quase caiu.
Me lambeu o rosto, chorou, deitou no meu colo como se dissesse:
“Demorou, mas você me achou…”
Chamei meu pai, e juntos levamos ele pra casa. Cuidei dele com todo carinho do mundo. Costurei a alma daquele cachorro com cada dia que passamos juntos depois daquilo.
E Bento viveu. Viveu muitos anos depois disso.
Morreu velhinho, ali deitado na varanda, ouvindo o canto do galo e o cheiro da terra molhada depois da chuva.
Sabe… até hoje, quando escuto um latido ao longe no meio da noite, eu fecho os olhos e penso:
“É o Bento, ainda me protegendo…”
...
Porque por aqui... a gente não esquece quem nos protegeu. 🐾Se essa história tocou teu coração... fica comigo até o fim das outras que vem por aí.
E se puder, se inscreve no canal CÃES BRASIL.
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